A exigência que recai sobre todos
#Minuto 92 é o espaço de opinião quinzenal de Ricardo Gonçalves Cerqueira, sócio do FC Porto, jurista e gestor de empresas
No mundo do desporto, somos, por natureza e por devoção clubística, extremamente exigentes. Escrevo somos, referindo-me aos sócios e adeptos que acompanham fervorosamente o seu clube, mas também à comunicação social especializada, aos comentadores e analistas que se movimentam na área.
Todos exigimos os melhores jogadores, os mais aptos taticamente e os que tecnicamente se diferenciam. Todos exigimos que o nosso clube se apresente com o melhor staff técnico, com o melhor treinador, o mais desenvolto departamento de comunicação, o mais qualificado departamento médico.
Exigimos das administrações que tudo providenciem sem mácula, de forma célere e a custo controlado. Desde as contratações mais sonantes, aos atletas mais credenciados e os treinadores mais acreditados. Queremos dispor das infraestruturas mais modernas, dos melhores equipamentos e dos mais capazes meios tecnológicos. Enchemo-nos de gáudio e perdemos horas no exercício de comparação com os melhores, os mais competentes, os top performers por essa Europa fora. Esta exigência é naturalmente acrescida quando se trata de futebol, em contexto de equipas profissionais, mas é igualmente notória noutras modalidades, sejam elas o hóquei, o andebol, o basquetebol e por aí adiante. Os profissionais da análise mantêm-se em permanente alerta, sendo lestos a identificar erros, omissões e impreparações das administrações e dos corpos técnicos nos diferentes contextos de competição.
A exigência, quando assente em realidade objetiva, é uma das vitaminas essenciais à evolução competitiva. Um clube com uma massa adepta atenta e reivindicativa está sempre mais próximo de ganhar, ou pelo menos de competir permanentemente com o fito de vencer. A exigência e o escrutínio alavancam-nos para desempenhos mais comprometidos e para níveis de performance próximos da excelência. É, por norma, o que sucede no desporto, mas também na vida profissional, no meio académico e nos mais diversos contextos.
Dentro do desígnio de alcançar a vitória, há uma plêiade de variáveis que devem ser entendidas, estudadas e é sobre essas que se exige resposta capaz a quem de direito. A planificação das épocas desportivas, a constituição dos plantéis, a escolha e seleção de atletas, estas são as variáveis que dependem diretamente da vontade e do acerto de quem tem a capacidade e a responsabilidade de gerir. Assumem, por isso, uma dimensão fundamental nas conquistas, pelo que dominá-las e executá-las criteriosamente pode significar a vitória ou a derrota, a conquista ou a perda deste ou daquele troféu.
Há, no entanto, uma dimensão neste ecossistema de atores do desporto profissional e de alta competição, que se mostra preponderante pelo impacto direto que as suas decisões têm no desenlace do jogo, e que resistem — evitando até — este escrutínio. Não raras vezes, reagem com acrimónia quando sujeitos ao tal exame de exigência, a que são submetidos todos os demais intervenientes do universo desportivo, sejam eles dirigentes, treinadores ou atletas.
A arbitragem. Os protagonistas das arbitragens. E não me refiro unicamente aos do futebol. Os juízes, os árbitros, são atores principais em todo o enredo das competições desportivas profissionais. São estes que, por omissão, desacerto de avaliação ou mero desleixo, podem transformar sucessos em insucessos, alegrias em profundas tristezas, com consequências muito significativas no campo emocional, desportivo e, sobretudo, financeiro das instituições.
Vem isto a propósito de um conjunto de exibições recentes de equipas de arbitragem e das sequelas que estas infligiram às competições e aos clubes nelas envolvidos. A primeira das quais, acontece aquando do jogo da final da Taça de Portugal.
Praticamente todos, ou pelo menos uma larga maioria, dos que assistiam ao jogo perceberam, notaram, que um jogador do Sporting agrediu, com uma pisadela, um jogador do Benfica. Não há outra forma de adjetivar o que ali aconteceu. Foi uma agressão. Ainda assim, e ainda que evidente, nem o árbitro, nem os árbitros assistentes, nem tão-pouco o videoárbitro, sentado diante de vários ecrãs na Cidade do Futebol, se aperceberam do que ali ocorreu. A dúvida que legitimamente nos assiste é esta: como é que é possível que profissionais preparados, dotados dos meios tecnológicos necessários, não vislumbrem o que um comum adepto identifica à vista desarmada? O que é certo é que até ao dia de hoje não foi prestado qualquer esclarecimento, não se ouviu qualquer comentário por parte do visado, do Conselho de Arbitragem ou da associação que representa a classe.
Mas ocorrências esdrúxulas não se esgotam no futebol. No hóquei em patins, no jogo que opôs FC Porto e Sporting, o quarto de uma série de cinco que visavam apurar um dos finalistas, assistiu-se a um desempenho infeliz da equipa de arbitragem. A dualidade de critérios, as decisões perfeitamente anacrónicas e a gestão incompreensível do jogo vieram colocar a nu a impreparação para ajuizar um jogo com aquela importância. Acresce que, também aqui, e uma vez mais, não se conhece uma explicação de quem tem a responsabilidade de nomear e acompanhar o desempenho dos árbitros da modalidade.
No andebol, no jogo da final da Taça de Portugal, que opôs o FC Porto ao Sporting, a equipa de arbitragem expulsou, com um vermelho direto, um jogador do FC Porto ainda nos minutos iniciais da partida, decisão que veio a condicionar de forma determinante o desempenho da equipa de Magnus Andersson até ao final.
Uma arbitragem, que se pretenda competente, define-se pela discrição, pela capacidade pedagógica com que dirime e intervém nas contendas entre os atletas e, sobretudo, pela inteligência de permitir um jogo fluído e sem sobressaltos. Se a tudo isto somarmos competência, imparcialidade e aptidão para o desempenho da função talvez consigamos resolver uma parte significativa das irritações que vão assolando o país desportivo.
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Parabéns FC Porto: Em ano de estreia, a equipa de futebol feminino do FC Porto foi campeã nacional da III Divisão, sem derrotas! Parabéns.
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Portugal convincente: A Seleção Nacional venceu a Liga das Nações com duas exibições convincentes. Um lote de jogadores de classe mundial que vê reconhecido todo o seu talento.
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Mundial de Clubes sem árbitros portugueses: de entre os 117 árbitros, oriundos de 41 países, nomeados para participar no Mundial de Clubes, não há um único português.